Ritmo de Marca-passo - Ricardo Sobral

Senhora de 84 anos admitida no PS por sepse de provável foco abdominal. Desidratada com K=6,3. Sem queixas cardiovascular. Feito ECG por bradicardia ao monitor.

Existe falha no marcapasso? Qual?




Mateus Viana


Hemodinamicista não sabe ver ECG...  Mas vou arriscar. 
Vejo um ritmo de marcapasso bicameral, modo DDD, com FC magnética de 84 ppm (possivelmente, para este aparelho, a bateria está OK. Teríamos que ver as especificações).  No primeiro ECG há um ritmo de escape aparentemente juncional da paciente com FC de 66 bpm, porém, como esta apresenta hipercalemia, temos que pensar em "achatamento" das ondas P devido a este distúrbio eletrolítico, um provável início de ritmo sinoventricular... Nestes casos, a condução do estímulo atrial seria feita pelo feixe de Bachmann (hipótese, acho que nunca foi provada), que possui fibras mais resistentes a hipercalemia. Isto poderia explicar o eventual mau funcionamento do aparelho. Haveria uma falha de "sense" atrial, pelo achatamento das ondas P? 

André Durães

O marcapasso apresenta falha de sensibilidade e de captura? Em DII o paciente parece ter um ritmo próprio ventricular (cade onda p?)  e o marcapasso não sentiu em alguns momentos nem gerou captura ventricular em outro? Vejo um QRS de base um pouco alargado sem onda P ?Em DII o 2º e no 5º ciclos não houve captura ventricular e o 3º não teve comando atrial do MP ? se for tem falha de captura e falha de sensibilidade?

Alan Hamilton

Falha de ensibilidade ventricular com certeza, existem várias espícula ventriculares caindo após o QRS próprio do paciente. Atrial é difícil dizer uma vez que no 1o ECG sem imã não se identifica onda P ( Talvez uma em baixa do espícula no 1o complexo de AVL no penúltimo complexo em V6 e DII longo. Falha de Caputura eu não diria com tanta certeza uma vez que todas as espículas ventriculares sem captura estao caindo dentro ou logo após o QRS ppróprio podendo a não captura ser devido ao período refratário, quanto a espícula atrial estão sempre caindo antes e próximos dos QRS proprios, podendo a onda de captura atrial estar oculta pela despolarização ventricular. Além do mais no ECG com imã após assumir o a FC magnética o MP apresenta 100% de captura atrial e ventricular. Acredito ser o paciente portador de doeça do sistema excito condutor com comprometimento de Nó sinusal e AV, com MP com falha de sensibilidade ventricular e possivelmente atrial.


Entre Miopericardites sem EST difuso, 2 dissecçoes espontãneas de coronárias pós parto, Síndromes de Abalonamento apical, TAC de Tx compatíveis com TEP maciço bilateral em pacientes assintomáticos com ECO normal e ECGs com CrossTalking, vemos que a UCI esta se tornando uma escola pra todos nós. 

Acho que deverámos mudar o significado da sigla UCI ( Unidade de Casos Interessantes), precisamos colocar Dr House na escala!


Cláudio das Virgens


Avaliando o ECG 1 não se identifica falha de "sense" ou captura, porém o que identificamos é um MP DDD com FC programada muito próxima  da FC basal em ritmo juncional. Neste contexto podem ocorrer estímulos que são deflagrados pela baixa FC sem condução, o que poderia causar um fenômeno denominado crosstalk, que pode inibir o estímulo do ventricular, que poderia causar assistolia e morte. O fato é que os modernos MP tem um protocolo denominado safety pacing que deflagra atividade ventricular após 110 ms de um estimulo atrial que poderia inibir a estimulação ventricular, evitando o crosstalk (observado qdo temos duas espículos em um único QRS). Vejam que qdo se coloca o imã e ocorre aceleração da FC (ECG 2) tal fenômeno não se repete sugiro leitura do Capitulo de estimulação artificial do Branwald em especial a figura 81.19. Toda descrição acima teve a orientação de Alex Fagundes, meu mestre em ECG.

Explicação - Ricardo Sobral

Obrigado a todos que participaram da discussão.
Realmente como já foi dito, nestes ECGs não existem falhas de comando ou de sense do marcapasso.
Primeiramente observamos que no ECG sem ímã não visualizamos ondas P e o ritmo ventricular é regular, o que sugere ser um ritmo juncional. As ondas P geradas pelo ritmo juncional sobem retrogradamente e alcançam o eletrodo atrial.  Quando o canal atrial está em período de blanking, ou seja, em período cego, o marcapasso interpreta como se não houvesse onda P e gera um estímulo. Já quando a onda P retrógrada alcança o eletrodo fora do periodo cego,  o marcapasso é inibido, o que explica a presença ou ausência de espículas atriais.
Já a segunda espícula no segundo, quinto e oitavo QRS, como Dr Cláudio falou, é um mecanismo de proteção contra um fenômeno chamado de cross talk ( sense ventricular de um estímulo atrial). Em caso de cross talk, o canal ventricular sente uma frente de onda muito próxima de um pace atrial, que pode ser o próprio átrio ou um ventrículo precoce. Se for o átrio e o marcapasso interpretar como ventrículo, ele irá se inibir e haverá um periodo de assistolia. Em razão deste risco foi projetado um mecanismo de segurança chamado de safety pacing que emite um estímulo ventricular 100 ms após um sense ventricular que ocorre logo após estímulo atrial. Outro momento que este fenômeno pode ocorrer é após uma extra sístole ventricular logo após um estímulo atrial.
Resumindo, nestes ECGs não existem falhas do marcapasso e sim uma resposta adequada de sua programação.
O intuito de mandar este ECG, foi mostrar que os marcapassos mais modernos possuem protocolos de proteção que podem simular falhas de sense e de comando.

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