Clopidogrel with Aspirin in Acute Minor
Stroke or Transient Ischemic Attack


Hoje deixaremos um pouco a cardiologia e falaremos de neurologia, discutindo sobre pacientes com acidente vascular cerebral (AVC) isquêmico. A intenção será a de testar a eficácia da associação de clopidogrel e aspirina na prevenção de AVC, em comparação com a aspirina isolada. Estudos anteriores já demonstraram que o uso dessa associação além de não reduzir a incidência de AVC levou ao aumento do sangramento intracerebral. Entretanto, esses estudos não foram dimensionados para responder em definitivo a questão e, assim, o estudo chinês CHANCE, recentemente publicado no The New England Journal of Medicine, selecionou pacientes com AVCI ou AIT, com menos de 24 horas de início do evento, dividindo-os em  grupos para o uso de clopidogrel e aspirina versus aspirina, em um seguimento de 90 dias.
Dessa forma, em um estudo duplo-cego, randomizado, controlado por placebo, o CHANCE randomizou  aleatoriamente 5.170 pacientes dentro das 24 horas após o início da AVCI menor, definidos como aqueles com pontuação menor ou igual a 3 pontos na escala do NIHSS, ou AIT de alto risco, definido por uma pontuação igual ou superior a 4 na escala ABCD2. Ambos os grupos receberam uma dose de 75 a 300 mg de aspirina no 1º dia. No grupo da terapia combinada de clopidogrel/aspirina foi utilizada a dose de ataque declopidogrel de 300 mg seguida pela manutenção de 75 mg do 2º ao 90º dia associado com aspirina na dose de 75 mg nos primeiros 21 dias. No grupo placebo/aspirina foi mantido a dose de 75 mg de aspirina do 2º ao 90º dia. A lista de critérios de exclusão é extensa, citando entre outras: pacientes com hemorragia; malformação vascular, tumor, abscesso, ou outra patologia cerebral não isquêmica; sintomas sensoriais isolados como dormência, alterações visuais, tontura ou vertigem, sem evidências de infarto agudo na TC ou RM do crânio; indicação clara para a terapia de anticoagulação; contra-indicação para clopidogrel ou aspirina; uso de antiplaquetários não estudados ou de AINE por longo prazo e que afetem a função plaquetária, bem como o uso de heparina ou anticoagulante oral até 10 dias antes da randomização. O desfecho primário de eficácia foi AVC (isquêmico ou hemorrágico) e o  desfecho primário de segurança foi a ocorrência de evento hemorrágico moderado a grave, de acordo com o GUSTO dentro dos 90 dias.
Na avaliação dos resultados, o AVC ocorreu em 212 pacientes (8,2%) no grupo clopidogrel/aspirina e em 303 pacientes (11,7%) no grupo da aspirina, sendo o percentual de 7,9% de AVCI no grupo clopidogrel/aspirina contra 11,4% no grupo tratado com aspirina. Não houve diferença entre os grupos estudados na ocorrência de AVCH (0,3%), morte vascular (0,2%) e morte de qualquer causa (0,4%). Acontecimentos hemorrágicos moderados ou graves, definidos pelo critério GUSTO, também não apresentaram diferença estatística com taxa de 0,3% em ambos os grupos. A taxa de qualquer evento de sangramento foi 2,3% no grupo de Clopidogrel/aspirina, em comparação com 1,6% no grupo aspirina.
Analisando o que foi proposto e o que de fato foi realizado nesse estudo, percebesse que não houve de fato, ao longo de todo seguimento, a comparação entre a associação clopidogrel/aspirina e somente aspirina. Em uma população altamente selecionada, com NIHSS < 3, a comparação entre os dois grupos ocorreu somente nos primeiros 21 dias do estudo, período considerado segundo os autores como  crítico para ocorrência de AVC, em especial as primeiras 48 horas. A partir dos 21 dias até o final dos 90 dias o que se teve foi um comparativo direto entre clopidogrel e aspirina. Também é importante observar que não houve no grupo da aspirina uma padronização da dose de ataque da aspirina, variando de 75 mg a 300 mg de acordo com a orientação do médico assistente.
A partir desses resultados, então, e com base em um grande estudo, com critérios científicos bem definidos, podemos concluir que a terapia antiplaquetária dupla pode ser mais eficaz do que a terapia antiplaquetária única no AVC/AIT. Sendo assim, segundo o CHANCE, a adição de clopidogrel a aspirina nas primeiras 24h de início dos sintomas, reduz o risco de AVC recorrente em 32% quando comparado a AAS isoladamente, com redução absoluta do risco em 3,5 pontos percentuais, o que equivale a NNT: 29 pacientes para prevenir um novo AVC ao longo de 90 dias. E o  mais impressionante é que a terapia antiplaquetária dupla não levou  a aumento de eventos hemorrágicos, fato este que não observamos quando utilizamos terapia antiplaquetária dupla para tratamento de síndromes coronarianas agudas com aumento de sangramento em 38%.

Passamos a nos questionar, então, se devemos utilizar esta forma de terapia para todos os pacientes com AVC/AIT de recente começo. Para tal lembramos que o estudo excluiu pacientes com AVC isquêmico grande (grande possibilidade de transformação hemorrágica) e os pacientes com AIT com déficits sensoriais, visuais ou síndromes vertiginosa que apresentam  baixo risco para recorrência. Alguns também podem questionar o fato da população ser exclusivamente de chineses e estes resultados não serem aplicados a outras populações. Na China os paciente acometidos de AVC são, em média, 6 a 8 anos mais jovens do que a população ocidental, além de serem levantados variações genéticas e possíveis impactos no metabolismo do colesterol.  Até o momento, porém,  não temos nenhuma base cientifica para acreditar que deverá haver modificação da resposta na população ocidental. Visando responder essa questão iremos aguardar com ansiedade os resultados do estudo POINT em andamento nos EUA.

Comentários

  1. Estudo muito interessante... apesar d'eu estar voltado para cardiologia, neurologia é um estudo bem interessante também, e muito importante.

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