HOPE 3 E SUA POLARIDADE NOS RESULTADOS




Em abril desse ano, foi publicado simultaneamente no NEJM, os dois braços do estudo HOPE 3 onde avaliou pessoas sem doenças cardiovasculares, mas com risco intermediário para tal, a fim de analisar o impacto na redução na pressão arterial e nos níveis de colesterol. Foi um estudo multicêntrico (participaram todos os continentes), randomizado, placebo controlado, onde se propôs a comparar 12.700 pacientes entre eles mulheres acima de 65 anos, homens acima de 55, aqueles com relação cintura quadril aumentados, além de pessoas com baixo HDL, tabagismo atual ou recente, história familiar de DAC precoce, alteração na glicemia e leve disfunção renal (nessa população, haviam não hipertensos e hipertensos com PA controlada). Após a fase de run-in (retirou os maus aderentes e que tiveram efeitos adversos importantes), estes participantes foram randomizados a receberem a combinação de Candesartana/HCTZ versus placebo em um braço, e Rosuvastatina versus placebo no outro, cujo principal objetivo era reduzir mortes por causa cardiovasculares e IAM/AVC não fatais (desfecho combinado). A média inicial da PA sistólica nos dois grupos foi de 138 +-14mmHg, e no final do acompanhamento de 5,6 anos, mostrou uma diferença de 6 mmHg na pressão sistólica para o grupo da intervenção. Quanto ao LDL, a média foi 127 +-36, com uma redução de 26% (34mg/dl).
Controle da pressão arterial e colesterol reduzem risco de eventos cardiovasculares, fato! Principalmente naqueles com diabetes, doença renal e vascular, e naqueles com lesão de órgão-alvo causada pela própria HAS. Mas, e naqueles sem fatores de risco para doença cardiovascular? Ou com risco dito intermediário, qual número da pressão almejar? A partir de qual valor devemos iniciar nossa intervenção? 130, 120, 115mmHg? E quanto ao LDL, seu valor mais baixo numa população com estas características, e com grande diversidade étnica, teria algum benefício?

O HOPE 3 foi um estudo bem desenhado, com baixo risco de viés, e com poder estatístico (>80%), cujo resultado no seu ‘braço hipertensão’ nos faz acreditar na veracidade da informação que trouxe em sua conclusão: a redução da PA em pacientes ditos como intermediários para risco cardiovascular NÃO reduz desfechos importantes (4.1% vs. 4.4%, P = 0.41). Porém, avaliando cuidadosamente os subgrupos, sabendo da limitação que é esta análise, vemos que naqueles com PA mais elevada, >143mmHg, (naqueles considerados hipertensos leves), foi onde se obteve redução significativa de desfechos – 5.7% vs 7.5, P = 0,009, HR 0.76 (0.60-0.96) – , sendo estes um grupo de pacientes que já sabemos do benefício do controle da PA.

Dessa forma, é consenso que façamos controle de pressão arterial, porém, ainda é discutível qual nível de faixa pressórica deveríamos iniciar nossa intervenção a fim de evitar eventos cardiovasculares, afinal pressão arterial adequada é necessário para a homeostase, mas o seu limiar ainda é impreciso, mas parece que o real benefício da intervenção seja um valor mais próximo aos níveis que atualmente consideramos hipertensão arterial.   

Do outro lado, no ‘braço colesterol’, o uso da estatina reduziu eventos cardiovasculares maiores (desfecho combinado) ao longo dos 5 anos de acompanhamento, 3.7% vs 4.8%, HR 0.76 (0.64–0.91), P =  0.002, porém, observando cada desfecho separadamente, vemos que essa redução se obteve à custa de IAM e AVC não fatais, e não houve redução na mortalidade por causas cardiovasculares. Analisando a relevância no desfecho combinado, o NNT foi alto e impreciso, 91 (58-232), mas foi seguro, onde o NNH foi de 90 para fraqueza e mialgia (reações que tiveram diferença estatística, lembrando que muitos pacientes não entraram na randomização após a fase de run-in).


Assim, de um lado, enquanto há discussão sobre se devemos ou não almejar níveis cada vez mais baixos de PA em uma população sem doença cardiovascular, mas com certos fatores de risco (aqui, o ‘braço hipertensão’ não mostrou benefício), do outro, parece que quanto mais baixo o LDL, mais redução de eventos cardiovasculares haverá, e ainda poderá ser maior se pensarmos que a estatina serve como uma poupança cujo benefício desfrutaremos após 10, 15, 20 anos de seu uso contínuo.  

http://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa1600176
http://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa1600175  

Comentários

  1. Ótimo resumo! ��������
    "a estatina serve como uma poupança cujo benefício desfrutaremos após 10, 15, 20 anos de seu uso contínuo."
    A importância da indicação precoce e correta do uso da estatina é algo muito relevante e que está sempre presente nas nossas discussões.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Ritmo de Marca-passo - Ricardo Sobral

ESTUDO ISIS - 2