Série DAC -  estudo TIMACS: Quanto mais rápido melhor?



www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa0807986

Estudos randomizados prévios mostraram o benefício da estratégia invasiva nos pacientes vítimas de SCA sem supra de ST de alto risco. No cenário de IAM com supra de ST existe o consenso de se realizar CATE precoce e instituir o tratamento necessário prontamente, pois geralmente a artéria culpada está ocluída, levando a uma isquemia transmural. Entretanto, no IAM sem supra de ST o tempo ideal para realização do CATE é controverso, sendo o tempo médio de sua realização, nos estudos prévios, muito variável.  
O estudo TIMACS (Timing of Intervention in Patients With Acute Coronary Syndromes) foi um estudo randomizado, grupo paralelo, multicêntrico com adjudicações cegadas de desfechos que teve como objetivo avaliar se uma estratégia invasiva precoce seria superior à estratégia tardia.
Foram randomizados 3031 pacientes, dos quais os 1638 iniciais foram derivados da coorte do estudo OASIS 5 (Fondaparinux vs Enoxaparina em SCA sem supra ST ) os quais foram divididos em dois grupos: intervenção precoce (CATE dentro das 24 horas do início da SCA sem supra de ST e tratamento adequado necessário tão logo fosse conhecida a anatomia coronariana) e intervenção tardia (CATE após 36 horas do evento e tratamento adequado em qualquer tempo após CATE). Foi aberta a possibilidade de crossover caso o paciente apresenta-se algum dos critérios a seguir: isquemia refratária com ECG isquêmico documentado em tratamento medicamentoso ótimo; supra ST em duas derivações de mesma parede sem onda Q ou T > 3mm; evolução para Killip III ou IV.
Os critérios de inclusão foram: SCA sem supra de ST dentro de 24 horas do início dos sintomas e mais dois dos três a seguir: idade > 60 anos; ECG isquêmico; alterações de MNM acima do limite de normalidade. Já os critérios de exclusão: não candidatos à revascularização coronariana; comorbidades com expectativa de vida < 6 meses; idade < 21 anos. Os pacientes derivados do estudo OASIS 5 ainda tiveram os seguintes critérios: contraindicação à HBPM; Cr > 3g/dL; AVCh nos últimos 12 meses; em uso de ACO.
Durante o estudo foi recomendado uma terapêutica com DAPT (aspirina + clopidogrel). O uso da GP IIb/IIIA ficou a cargo do médico assistente . Os pacientes derivados do estudo OASIS 5 utilizaram enoxaparina ou fondaparinux  enquanto que os recrutados posteriormente puderam usar HNF, HBPM, fondaparinux ou bivalirudina de acordo com a escolha do médico assistente. Além disso, foi recomendado beta-bloqueador, estatina e IECA/BRA. Devido a diferenças entre os pacientes derivados do estudo OASIS 5 e dos recrutados após quanto ao tratamento clínico, foi realizada uma análise de heterogeneidade do tratamento em relação aos desfechos para avaliar se haveria uma diferença estatisticamente significativa entre os grupos, porém não houve.
O desfecho primário foi um composto de morte; novo  IAM ou AVC em seis meses. Entretanto, AVCi não é um evento que precederia a SCA, levando o paciente a realização de CATE precoce, mas sim um desfecho de segurança relacionado ao tratamento em si. Acharíamos mais adequado colocar o mesmo como desfecho de segurança, deixando apenas morte e novo IAM como desfechos primários. Uma alternativa seria a inclusão de disfunção de ventrículo esquerdo, esse sim um marcador de gravidade da SCA e que necessitaria de uma intervenção mais precoce.
Os desfechos secundários foram: (1) composto de morte, IAM ou isquemia refratária e (2) composto de morte, IAM, AVC, isquemia refratária ou nova intervenção em seis meses.
Em relação ao desfecho primário não houve diferença entre os grupos de intervenção precoce ou tardia [9,6% vs 11,3%  RR 0,85 (0,68-1,06) p 0,15 em 6 meses e 6,7% vs 7,6% RR 0,88 (0,67-1,15) p 0,34 em 30 dias]. Quando analisados os desfechos secundários houve diferença estatisticamente significativa entre o grupo de intervenção precoce em relação ao grupo de intervenção tardia [(1) 9,5% vs 12,9% RR 0,72 (0,58-0,89) com p 0,003 e NNT 29 (18-70) seis meses sem significância em 30 dias; (2) 16,6% vs 19,5% RR 0,84 (0,71-0,99) com p 0,04 e NNT 34 (18-512) em seis meses e 6,6% vs 9,3% RR 0,7 (0,54-0,90) com p 0,006 e NNT 37 (23-107).
Entretanto, quando separados os componentes dos desfechos secundários, a diferença estatisticamente significativa encontrada deveu-se ao componente isquemia refratária, sendo os demais componentes negativos (morte, AVC, IAM). Já é sabido que o tratamento invasivo seja ele percutâneo ou cirúrgico é superior ao tratamento clínico no controle de angina e da isquemia refratária.
Quando estratificados a partir do GRACE SCORE (< 140 vs ≥ 140) os pacientes com GRACE mais alto tiveram benefício quando submetidos à estratégia invasiva precoce [13,7% vs 21,6% RR 0,62 (0,45-0,83) com NNT 12 (8-27)]. Contudo, cabe ressaltar que o estudo não foi concebido com esse intuito e esse achado deve ser levado como uma possível hipótese a ser testada. Os autores inclusive falam a respeito dessa limitação na sua discussão, entretanto na conclusão do artigo superestimam o que foi encontrado, distanciando-se do objetivo principal na realização de um estudo científico: comprovar ou refutar a pergunta realizada.
Sob a lente da plausibilidade extrema parece sensato que quanto mais grave for o paciente, maior será o benefício da estratégia invasiva precoce assim como é em tantas outras terapêuticas: a redução relativa do risco é igual para todos, porém a redução absoluta do risco é maior quanto maior o risco for da população estudada. Concluindo, devemos sempre ser cautelosos quanto aos resultados dos estudos, os quais devem nortear nossa prática diária e não virar verdadeiras “receitas de bolo”.


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