MINOCA: O curioso infarto sem obstrução







     Cada vez mais nos deparamos com aquele paciente com dor torácica, com alteração dinâmica no ECG, curva de marcadores de necrose miocárdica e quando o levamos para a angiografia, não encontramos lesões obstrutivas. E agora, qual o diagnóstico?

     Para essas situações, vem crescendo o conceito de MINOCA, o termo em inglês para Infarto do Miocárdio com Artérias Coronárias Não Obstrutivas, referente às lesões menores que 50% na angiografia. E para o seu mecanismo, há várias teorias, desde desobstrução da placa, tromboembolismo, espasmo, miocardite clinicamente imperceptível, desajuste entre oferta e demanda, até miocardiopatia de Takotsubo. E para esta nova entidade, o seu tratamento é baseado em extrapolações. Daí surgiu um grande estudo observacional a fim de apontar para possíveis opções terapêuticas, o Medical Therapy for Secondary Prevention and Long-Term Outcome in Patients with Myocardial Infarction with Non-Obstructive Coronary Artery (MINOCA) Disease, publicado no Circulation em fevereiro de 2017.

     Este estudo foi baseado em registros populacionais da Suécia, o qual avaliou 9 mil pacientes entre 2003 e 2013 com MINOCA, com a intenção de averiguar mortalidade geral e internamentos por AVC, IAM e IC (desfecho primário), comparando grupos que trataram ou não trataram com IECA/BRA, estatinas, beta-bloqueadores e dupla antiagregação plaquetária, todos analisados individualmente.

     O desfecho primário ocorreu em 23% no total, e as estatinas se mostraram com maior capacidade potencial de redução de eventos cardiovasculares maiores (HR 0.77, IC95% 0.68-
0.87), enquanto os IECA/BRA com 18% de redução, (HR 0,82, IC95%; 0.73-0.93). Os betabloqueadores apresentaram menor redução com um intervalo de confiança ultrapassando um pouco o 1 (HR 0.86, IC 95% 0.74-1.01). Já o uso de DAPT não apresentou diferença (HR 0.90, IC 95% 0.74-1.08).

     Podemos entender o porquê desses resultados. Primeiro já sabemos que quanto menor o nível de colesterol LDL, maior será o benefício para redução de eventos cardiovasculares em pacientes de risco moderado e alto, como já foi demostrado no HOPE 3, inclusive com valores de redução de risco praticamente iguais. (http://cardiologiahsr.blogspot.com.br/2016/06/hope-3-e-sua-polaridade-nos-resultados.html).  Segundo, na primeira admissão hospitalar dos doentes suecos (momento de introdução no estudo), havia um número considerável de hipertensos (57%), porém, uma boa parte não fazia uso de anti-hipertensivos, então, a partir do momento que melhor controla um importante fator de risco para aterosclerose, haverá evidência do benefício, como foi o caso dos IECA/BRA. Mas então por que os betabloqueadores obtiveram menor efeito? Provavelmente por serem anti-hipertensivos mais fracos.

     Quanto às limitações, temos as inerentes a um estudo populacional, e também o fato de não ter conseguido separar aqueles com coronárias normais daqueles com algum grau de lesão, e não ter tido os valores da adesão terapêutica ao final do acompanhamento. Outra limitação foi a falta de dados sobre os indivíduos que continuaram a investigação diagnóstica com outros exames, como por exemplo realizando ressonância magnética cardíaca.


   Enfim, este estudo sobre MINOCA foi interessante por ser o maior até então a estimular a discussão sobre esta intrigante situação e fomentar hipóteses para grandes ensaios clínicos randomizados futuramente. Dessa forma, sedimentando e aprofundando os nossos conhecimentos sobre o assunto, além da possibilidade de evolução do seu conceito, já que sua definição é muito ampla. Então, por enquanto, devemos avaliar caso a caso qual a melhor proposta terapêutica para nossos casos cada vez mais comuns, mesmo sendo empírica. 

http://circ.ahajournals.org/content/early/2017/02/08/CIRCULATIONAHA.116.026336?download=true

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