A eficácia da ECMO em pacientes com SARA grave: aquela esperança dos 45” do 2º tempo

O trial EOLIA ( ECMO to Rescue Lung Injury in Severe ARDS) recentemente publicado no NEJM traz resultados que nos coloca, talvez, na “estaca zero” quando o assunto é SARA grave.
A SARA (Síndrome da Angústia Respiratória Aguda), mesmo com estratégias ventilatórias protetoras, é associada a altas taxas de mortalidade e, a despeito dos grandes avanços na tecnologia dos circuitos da ECMO, o início precoce  desta terapêutica de substituição parece ainda ter seus benefícios não muito bem estabelecidos. Desde a pandemia de H1N1 em 2009 que estudos vêm sendo realizados na tentativa de evidenciar a superioridade em relação aos protocolos de baixo volume e baixa pressão; porém, ainda que com alguns resultados promissores, nada pôde ser concluído de modo a beneficiar a ECMO em virtude de questões metodológicas que comprometeram os resultados.
Já a ECMO nada mais é do que uma membrana extracorpórea de oxigenação usada como medida de suporte pulmonar e/ou cardíaco em doenças graves cardiopulmonares, que não trata a causa de base, mas que, teoricamente, fornece tempo para recuperação ou substituição do órgão acometido.
Neste trial multicêntrico, randomizado, patrocinado em grande parte pelo Ministério da Saúde da França, pacientes com SARA grave, com critérios pré-estabelecidos ao estudo bem definidos, foram elegíveis para tratamento com ECMO imediata vs tratamento convencional continuado, com possibilidade de cruzamento do grupo controle para o grupo ECMO naqueles que apresentassem hipoxemia refratária e cuja análise do desfecho principal foi mortalidade em 60 dias. Dentre os pacientes do grupo controle, todos receberam a mesma estratégia ventilatória e de terapia adjuvante, tal qual os pacientes do grupo ECMO, que receberam as mesmas estratégias de medidas ventilatórias protetoras, de modo que os autores tentaram manter populações homogêneas, a fim de que fosse minimizado o viés de performance. Para análise estatística de resultados, foi utilizada uma metodologia de desenho triangular com regras de parada (definidas antes do início do estudo); ou seja, foi calculado o tamanho amostral necessário a fim de que o poder do estudo alcançasse 80% e, em caso de uma das regras de parada do estudo serem atingidas (evidência de dano; evidência de superioridade da ECMO; ausência prevista de diferença significativa), o mesmo poderia ser interrompido de maneira precoce sob a prerrogativa estatística de que o objetivo do estudo não seria alcançado.
E assim aconteceu: o estudo foi interrompido antes de alcançar o tamanho amostral pré-definido (249/331 pacientes) por ter atingido uma das regras de parada: futilidade (ou a ausência de diferença significativa). Isso quer dizer que a aplicação precoce da ECMO não foi associada a menor mortalidade aos 60 dias (desfecho principal) de acordo com a análise feita; análise esta que incluiu os pacientes que necessitaram mudar do grupo controle para grupo ECMO, fazendo-nos duvidar da análise de resultado final, uma vez que existe a tendência do benefício para o grupo ECMO (Será que essa taxa de cruzamento não “diluiu” o benefício potencial da ECMO?). Se pararmos para pensar, também, que a amostra foi pequena, será que essa regra de parada não está sujeita a erro? Será que, diante da interrupção, pode-se inferir que o estudo foi, de fato, negativo para detectar a diferença pré-estabelecida? Analisando as tabelas, houve, ainda, uma diferença absoluta entre os grupos, porém sem significância estatística; logo, será que a futilidade não foi precoce? E, até que ponto posso considerar que o “p” de 0,09 não seria significativo estatisticamente se o estudo tivesse continuado? São perguntas que, neste momento, não temos resposta, mas, que valem a reflexão. Talvez, se esperássemos aqueles últimos segundos do 2º tempo, o gol tivesse “saído”....

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