Effects of Immediate Blood Pressure Reduction on Death and Major Disability in Patients With Acute Ischemic Stroke (CATIS)
JAMA 2013: dii: 10.1001/ja,a.282543 (CATIS Trial)
O controle da elevação da pressão arterial após episódios de acidente vascular encefálico é prática comum e de longa data, entretanto, não existem evidências que dêem suporte a esta conduta. É exatamente esta falta de evidência o racional que deu origem ao CATIS. Este trial Chinês publicado em 2013, multicêntrico e unicego, randomizou 4071 pacientes para receberem ou não tratamento com anti-hipertensivos na fase aguda de AVCi, com o objetivo de avaliar como desfecho primário morte ou sequela maior em 14 dias ou até alta hospitalar.
O estudo admitiu maiores de 22 anos com
AVCi confirmado por TC ou RNM de crânio e que apresentassem níveis de pressão
sistólica maiores que 140 mmHg e menores que 220 mmHg e pressão diastólica
inferior a 120 mmHg. Foram excluídos pacientes que tivessem IC severa, infarto
agudo do miocárdio, angina instável, dissecção de aorta, estenose cerebrovascular,
pacientes que estivessem em coma profundo e por último, mas não menos
importante todos paciente submetidos a trombólise. Mas porque o CATIS excluiu pacientes com
elevações mais importantes dos níveis pressóricos? A justificativa do trabalho
é que está bem estabelecido nos guidelines atuais que indivíduos com PAS
> 220mmHg ou PAD > 120mmHg merecem redução da pressão arterial.
A amostra foi formada por pacientes com
idade média de aproximadamente 62 anos, sendo a maioria homens (64%), com tempo
entre sintomas e randomização de 15 horas, níveis pressóricos médios de
166/96 mmHg, possuindo a maioria NIHSS baixo (4) e sendo a maior parte hipertensos prévios. Em relação à etiologia do
AVCi 77% foram trombóticos, 20% lacunares e apenas 5% embólicos. Acreditamos
que a menor incidência de eventos embólicos, em relação a outras fontes, são
decorrentes da exclusão dos pacientes com fibrilação atrial.
O estudo foi conduzido da seguinte maneira:
no grupo intervenção os pacientes foram medicados dentro das primeiras 24 horas
após randomização com anti-hipertensivos (IECA > BCC > diuréticos) visando
redução dos níveis pressóricos em 10-15% dentro das primeiras 24 horas e para
um faixa inferior a 140/90 mmHg em 7 dias, enquanto isso no grupo controle
nenhuma medicação foi utilizada e os níveis pressóricos evoluíram de acordo com
a reposta fisiológica de cada individuo.
Vamos agora analisar os resultados. A primeira
coisa importante que observamos é que de fato o estudo fez o que se propôs a
fazer: controlou os níveis pressóricos no grupo intervenção. No sétimo dia neste
grupo a média de PAS foi 137 mmHg versus 146 mmHg no grupo controle (p<0.001).
Lembrando que os valores de PAS no momento da admissão eram similares nos dois
grupos (quase 170 mmHg). Temos a
primeira informação interessante:
independentemente de receber medicação a resposta habitual do organismo após a
apresentação inicial de um AVCi é a redução dos níveis pressóricos.
Olhando agora para o desfecho primário
(morte ou seqüela maior em 14 dias ou até a alta) o que o CATIS nos mostrou foi
uma incidência deste em 683 pacientes do grupo intervenção (33,6%) e 681
(33,6%) no grupo controle. Essa igualdade percentual e quase numérica absoluta nos
impressiona e dar força as conclusões do trabalho que mostram que não existe
benefício em controlar pressão arterial na fase aguda do AVCi, bem como não
existe malefício em o fazer. Então se algum dia você se sentiu mal por passar o
plantão para o colega com um paciente após AVCi hipertenso, esqueça pois você
não errou, é apenas uma pessoa a frente do seu tempo.
Em relação à análise de subgrupos relacionada ao desfecho primário e
secundário (morte ou seqüela maior em 3 meses), o tratamento com
anti-hipertensivos manteve seu efeito nulo independentemente de idade, sexo, diagnóstico
prévio de hipertensão, valores pressóricos na randomização, uso prévio de
anti-hipertensivos, NIHSS inicial, escore de Rankin ou mecanismo do AVCi. A
única exceção encontrada foi em relação ao desfecho secundário no sub-grupo tempo de sintoma até randomização. Pacientes
randomizados com mais de 24 horas de sintomas apresentaram menos eventos quando
receberam anti-hipertensivos (18% X 23% OR:0.73 IC:0.55-0.97). Lembramos que
estamos falando de análise de subgrupo dentro de um desfecho secundário e que
por isso a diferença encontrada pode estar relacionada ao acaso (erro tipo 1?). Esse resultado não
nos permite afirmar que devemos na prática tratar esse subgrupo, ele deve
apenas levantar a possibilidade de um novo estudo desenhado especificamente
para analisar se essa diferença é real.
Por fim uma última pergunta deve ser
feita: uma vez que indivíduos com PAS >220mmHg foram excluídos deste
trabalho, poderíamos extrapolar os resultados encontrados para esta
população? Nos lamentamos pela
existência deste critério de exclusão e acreditamos que a plausibilidade
biológica diz que sim, porém como não analisamos de forma crítica as evidencias
utilizadas pelos guidelines vigentes que recomendam o contrário, paramos por
aqui com nossa humilde e ignorante opinião de cardiologistas e esperamos as
críticas e comentários.
Rafa, muito boa a análise do estudo. Ja percebemos que não podemos confiar cegamente nos guidlines não é verdade? Apesar de ja estar "bem estabelecido" o CATIS nao deveria ter excluido a população com PAS>> 220 mmhg, penso que teria sido muito interessante ver se os resultados corresponderiam mesmo com os guidlines.
ResponderExcluirMuito boa a análise, meus parabéns.
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