Estudo ATMOSPHERE – Alisquireno X Enalapril no tratamento da Insuficiência cardíaca: Uma associação segura? Uma substituição adequada?
Em abril de 2016 foi
publicado no NEJM o ATMOSPHERE ( “Aliskiren
Trial to Minimize Outcomes in Patients with Heart Failure )”, estudo duplo-cego,
multicêntrico, randomizado, iniciado em 2009, que teve como objetivos comparar a
superioridade ou a não-inferioridade do Alisquireno em relação ao Enalapril e a
superioridade da associação Alisquireno-Enalapril em comparação à monoterapia
com Enalapril nos portadores de insuficiência cardíaca crônica.
Desde que o benefício dos inibidores da
ECA no tratamento da insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida foi
bem estabelecido, alternativas no
bloqueio do sistema renina-angiotensina têm sido buscadas para pacientes que
não toleram estas drogas, ou ainda, como forma de potencializar seus efeitos.
Os primeiros substitutos eficazes foram os Bloqueadores dos Receptores de
Angiotensina, com benefícios já bem comprovados nos portadores de insuficiência cardíaca crônica.
Seria então o bloqueio direto da Renina uma alternativa eficaz ou ainda um
coadjuvante no bloqueio do sistema renina-angiotensina nesta população de
pacientes?
O ATMOSPHERE foi conduzido
e patrocinado pela Novartis, desenvolvido em 43 países e incluiu indivíduos
portadores de IC crônica, em classe funcional NYHA II a IV e com fração de ejeção ≤ 35%. Os pacientes deveriam ainda
estar em uso de doses estáveis de IECA e betabloqueador e apresentar BNP
plasmático ≥ 150 pg/ml ou NT-ProBNP ≥ 600 pg/ml(ou BNP plasm. ≥ 100 pg/ml ou NT- ProBNP ≥ 400 pg/
ml, se hospitalização recente). Foram excluídos da amostra os indivíduos que
apresentavam hipotensão sintomática, queda na taxa de filtração glomerular,
níveis séricos de potássio acima de 5, doenças hepáticas, pulmonares,
pancreáticas crônicas graves ou que limitassem a expectativa de vida para menos
de 5 anos, dentre de outros fatores.
O trial contou com uma fase preliminar, em
que 8835 pacientes foram submetidos a um
período de “run-in” em duas fases (i.e. receberam Enalapril na primeira fase e
Alisquireno na segunda fase do run-in), com o objetivo de eliminar do período
de randomização os pacientes que apresentassem intolerância a uma das duas
drogas. Após esta fase preliminar, cerca de 7000 pessoas foram randomizadas em
3 grupos: Monoterapia com Enalapril, Monoterapia com Alisquireno e terapia combinada
Enalapril + Alisquireno.
O estudo considerou com desfechos primários: morte
por causa cardiovascular ou hospitalização por insuficiência cardíaca; e teve como
objetivos co-primários testar se a associação Alisquireno – Enalapril é
superior ao uso isolado do Enalapril e ainda testar se o Alisquireno em
monoterapia é ao menos não inferior ao Enalapril a respeito dos mesmos
desfechos já citados. Os autores tentaram, assim, contemplar de uma só vez os
conceitos de superioridade e de não inferioridade num mesmo estudo.
Em abril de 2013 houve uma reviravolta na
condução do trial, que repercutiu em toda a condução do estudo, determinando alterações no seu plano de análise estatística. Com o ATMOSPHERE ainda em
andamento, outros dois trials - ALTITUDE e ASTRONAUT - foram finalizados devido à futilidade e à associação
com piores desfechos do uso do Alisquireno em portadores de diabetes. Estes
resultados, levaram às Agencias de Medicamentos da Europa a impor a interrupção
dos testes em portadores de diabetes e naqueles que desenvolveram diabetes
durante o estudo, com instituição da terapia convencional nestes pacientes.
Desta forma, apesar de todas as contra-argumentações do comitê
de segurança - que alegava populações diferentes
nos 3 estudos; diferentes desenhos , tendo o ATMOSPHERE a fase de run-in; além
de monitorização mais criteriosa pelo comitê de monitoramento de dados - o
estudo foi interrompido para o subgrupo de pacientes portadores de DM e 1944 pacientes
foram eliminados prematuramente, o que equivale a quase 1/3 do número total de
indivíduos randomizados.
Além dos 1944 pacientes portadores de diabetes que
tiveram dados censurados, outros 2140 pacientes foram suspensos por outras razões, exceto morte; um número
expressivo de indivíduos eliminados para um estudo de tão grande porte e com objetivos
tão audaciosos.
Após toda esta panacéia, o estudo chegou ao final em julho
de 2015 com resultados negativos. O Alisquireno em associação ao Enalapril não foi superior ao Enalapril em
monoterapia - Hazard Ratio: 0,93 (95% IC
0,85-1,03; P=0,17). E em monoterapia, o Alisquireno também não foi superior ao
Enalapril – Hazard Ratio: 0,99 (95% IC, 0,9-1,10; P= 0,91 para superioridade) e
também não foi não inferior , uma vez que, embora a margem de não inferioridade
de 1.104 desfechos tenha sido encontrada, o valor de P = 0,0184 não cumpriu a
exigência de um valor pré-especificado
para não inferioridade de P≤ 0,0123 ou menos.
Um dado adicional observado foi o aumento do número de mortes
por causas renais, doença renal terminal ou duplicação do nível de creatinina
sérica no grupo da terapia combinada em relação ao grupo do Enalapril. Hipotensão arterial
sintomática também foi mais frequente no grupo de terapia combinada. Os pesquisadores
não identificaram diferenças nos resultados dos pacientes diabéticos em relação
aos demais, mas devemos considerar o fato de o estudo ter sido interrompido precocemente para
esta população, o que pode ter influenciado enormemente nos resultados obtidos, minimizando os efeitos.
Muito boa discussão
ResponderExcluirExcelente!
ResponderExcluirNo post do alusquireno, será que a palavra panacéia está enpregada de forma adequada?
ResponderExcluirpanaceia
nome feminino
1. planta imaginária a que se atribuía a virtude de curar todas as doenças
2. figurado remédio para todos os males
(Do grego panákeia, «idem», pelo latim panacaea-, «idem»)
Ou seria melhor: após todas estas modificações...toda está atrapalhada...
Post excelente
Caro Dr. Cláudio, obrigada pela observação e pelo elogio!
ExcluirQuanto ao termo panacéia: pode ser ainda interpretado como "o que se emprega para remediar dificuldades".
Refiro-me às manobras adotadas pelos autores do estudo para remediar a situação imposta: inicialmente alegando diferenças entre os estudos citados e o ATMOSPHERE e, em seguida,com adaptações nos planos estatísticos , mudança nos desfechos secundários e todos os esforços em manter o estudo até a sua conclusão, mesmo com uma perda tão expressiva de pacientes.
'Apesar de toda essa "panacéia" ( ou todas essas medidas e manobras para remediar as mudanças impostas e manter o estudo viável) os resultados foram negativos.'
Este comentário foi removido pelo autor.
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