Devemos anticoagular o paciente renal crônico portador de FA?
Ainda é
desconhecido a real prevalência de pacientes com doença renal crônica (DRC) no
Brasil. Ana Marinho e cols 1, em 2017, descreveram que cerca
de 3 a 6 milhões de brasileiros são portadores de DRC, destes
mais de 100mil em terapia dialítica. Por outro lado, estima-se
que 10% dos pacientes com doença renal crônica dialítica sejam portadores de fibrilação
atrial (FA). A grande questão é: devemos anticoagular nosso paciente dialítico
portador de FA?
Pacientes
em diálise têm maior incidência de acidente vascular encefálico (AVE) e em
contrapartida, maior risco de sangramento, tornando a decisão pela
anticoagulação um assunto cada vez mais debatido e complexo. Então na busca de
respostas para nossa questão, foi realizado uma meta-análise publicada no JACC2
este ano, “ Oral Anticoagulation for Patients With Atrial Fibrillation on
Long-Term Hemodialysis”.
Para
essa meta-análise foi realizado pesquisa no MEDLINE e no EMBASE, totalizando
1.481 estudos, envolvendo uma população de 71.877 pacientes com FA em diálise a
longo prazo. O desfecho primário de redução de AVE e fenômenos tromboembólicos
não foi alcançado. Em contrapartida, os autores relatam, que a apixabana 5mg duas
vezes ao dia aparenta ter um risco menor de mortalidade em comparação aos
outros anticoagulantes. Como devemos analisar esse dado? Primeiro ponto a ser
observado: este foi um desfecho secundário e, portanto, não passível de
conclusões definitivas. Além do que, os estudos avaliados nesta meta-análise
foram observacionais e, portanto, sujeito a vieses de confusão. Podemos
considerar, que os pacientes que
receberam essa medicação tinham alto risco trombótico e poucas co-morbidades,
julgadas pelo médico no momento da prescrição, o que levou a um resultado
favorável para aqueles que fizeram uso da apixabana.
Outro dado
interessante foi associação da warfarina a um maior risco de sangramento quando comparada aos outros anticoagulantes, por quê? Provavelmente
deve-se ao fato do controle do RNI em pacientes renais crônicos ser muito
errático, além do uso regular de heparina quando em terapia dialítica.
Interessante
notar que o Food and Drug Administration (FDA) estendeu o uso de
apixabana para pacientes com doença renal terminal em hemodiálise com base em
dados farmacocinéticos. A dose indicada de
apixabana foi de 5 mg duas vezes ao dia, recomendam reduzir a dose para 2,5 mg
duas vezes ao dia quando idade ≥ 80 anos ou peso corporal ≤60 kg. Consideramos
que, sendo esta uma situação complexa a qual não temos resposta, devemos
individualizar cada caso e compartilhar a decisão de anticoagular ou não com o
nosso paciente portador de doença renal crônica terminal.
Referências
1. Marinho, AWGB, et al. Prevalência de
doença renal crônica em adultos no Brasil: revisão sistemática da literatura.
Cad. Saúde Colet., 2017, Rio de Janeiro, 25 (3): 379-388
2. Kuno, et al. Oral Anticoagulation for
Patients With Atrial Fibrillation on Long-Term Hemodialysis. JACC vol. 75, no.
3, 2020, January 28, 2020:273 – 8 5
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