Série DAC – Estudo CURE

Série DAC - Estudo Cure                



                                                                                                                                                                                                                  N Engl J Med 2001;345:494-502.

A trombose, causada por uma ruptura ou erosão da placa aterosclerótica, é o principal mecanismo das síndromes coronarianas agudas. Ao longo dos anos, muitas terapias foram estudadas com o intuito de reduzir a morbimortalidade dos pacientes vítimas dessa condição. Entretanto, apesar dos avanços com algumas terapias (aspirina, heparina, inibidor IIB/IIIA) os pacientes ainda experimentavam um risco considerável tanto a curto quanto em longo prazo. Com o advento dos Stents, mostrou-se que aspirina quando associada a uma nova classe de antiagregantes para a época (Tienopiridínicos) reduzia o risco de IAM em curto prazo. Contudo, não se conhecia o benefício dessa terapêutica em longo prazo.
Publicado em 2001 no NEJM, o estudo CURE teve como objetivo comparar a eficácia e segurança da adição do clopidogrel à aspirina em pacientes vítimas de SCA sem supra de ST.
Foi um estudo randomizado, placebo controlado, duplo-cego, multicêntrico, analisado pelo princípio de intenção de tratar que randomizou, dentro de 24 horas do evento, para uso de aspirina/placebo ou aspirina/clopidogrel. Inicialmente, os pesquisadores incluíram apenas pacientes acima de 60 anos, sem alterações ao ECG e com passado de DAC. Entretanto, após uma acertada revisão, passou-se a incluir pacientes com alterações ao ECG (que não supra ST) ou de MNM, selecionando assim uma amostra de maior gravidade. Foram excluídos do estudo pacientes que tinham contraindicação a terapêutica antitrombótica/plaquetária; alto risco de vir a desenvolver IC grave ou sangramento; uso crônico de ACO; revascularização miocárdica nos últimos 3 meses ou uso de GPIIB/IIIA nos últimos 3 dias.
Como desfecho primário o estudo teve um composto de mortes cardiovasculares, IAM não fatal e AVC. O desfecho coprimário foi um composto do desfecho primário ou isquemia refratária. O desfecho de segurança foi complicações hemorrárgicas, em que o autor subdividiu em complicações ameaçadoras à vida, maiores e menores. Os pacientes foram acompanhados logo na alta hospitalar, após um mês/três meses da alta e posteriormente a cada três meses até o fim do estudo.
A amostra inicial foi recalculada devido a uma ocorrência menor de desfechos no grupo controle do que o previsto pelos autores, somando-se 12.500 pacientes o que deu ao estudo um poder de 90% para detectar uma redução de risco de 16,9% e 16,4% nos desfechos primário e coprimário respectivamente. Foi feita análise de subgrupo e análise interina, porém o estudo não foi truncado.
Nos pacientes que fizeram uso da DAPT, houve uma redução de 20% e 14% nos desfechos primário e coprimário, respectivamente com um NNT considerado bom a razoável (47,6 e 43,5 respectivamente) se considerarmos a magnitude dos desfechos analisados. Interessante notar, que já nos primeiros trinta dias, podemos ver um benefício da DAPT nesse grupo de pacientes (RRR 21%) o qual permanece ao longo do primeiro ano (RRR 18%). A análise de subgrupo, apesar de toda limitação metodológica que a mesma traz, reforça esse benefício, à medida que em todos os subgrupos o uso da DAPT foi benéfico, sendo que o subgrupo que realizou previamente revascularização miocárdica apresentou o maior benefício.
Em relação ao desfecho de segurança, pacientes que fizeram uso de DAPT tiveram mais complicações hemorrágicas (NNH 28,6), porém à custa de sangramentos menores - NNH 37 (sangramentos maiores NNH 100 e os ameaçadores à vida não houve diferença).

Podemos concluir que a DAPT, na época feita apenas com aspirina e clopidogrel/Ticlopidina, reduziu os eventos isquêmicos a curto e longo prazo – um ano - com um NNT bom a razoável, à custa de um aumento do número de eventos hemorrágicos menores em sua maioria. Atualmente, com o advento e expansão dos stents farmacológicos torna-se praticamente obrigatório, salvo exceções, o uso dessa terapêutica, visando à redução da trombose de stent ao menos no primeiro ano do evento. Recentemente tivemos outro estudo também publicado no NEJM (PEGASUS TIMI-58) que avaliou a manutenção da DAPT (no caso o Ticagrelor) por mais de um ano, entretanto houve apenas um pequeno benefício, mitigado pelo aumento do risco de eventos hemorrágicos (NNT e NNH próximos e superponíveis) o que não invalida essa abordagem, porém não nos autoriza a utilizar em todos os nossos pacientes.  Cabe a nós médicos, à luz das evidências científicas e de nossa experiência, indicarmos a melhor estratégia para nosso doente.

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