Estudo PESIT - síncope e embolia pulmonar: Vale a pena investigar todo mundo?
http://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa1602172#t=article
O estudo
PESIT – um ensaio clínico Italiano recentemente publicado no NEJM - propôs-se a avaliar a prevalência de Embolia
pulmonar em pacientes hospitalizados por um primeiro episódio de síncope.
O seu racional
teórico se justifica na observação de que, muito embora esta entidade seja um
dos diagnósticos diferenciais de causa de síncope e com um potencial de
morbimortalidade elevado, até mesmo as principais diretrizes internacionais
abordam pobremente a associação entre TEP e Síncope.
A conclusão
do estudo foi de que em cada 6 pacientes internados com um primeiro
episódio de síncope, 1 apresentava embolia pulmonar. Esta conclusão gerou
grande repercussão, inclusive nas redes sociais; mas, como em tudo na vida (e
na ciência), calma e atenção são fundamentais ao analisarmos os resultados
deste estudo; do contrário, sairemos indicando angiotomografia pulmonar em cada
paciente que chegar com síncope na emergência!... E não é bem por aí.
Síncope é
definida como perda súbita e transitória da consciência, com duração de até 1
minuto, com reversão espontânea e sem associação com convulsão e outros
comemorativos. Foram incluídos no estudo todos os pacientes maiores de 18 anos,
internados para investigação de um primeiro episódio de síncope nos 11 centros participantes, independente de
haver outra causa mais provável para o evento, e excluídos aqueles com episódios sincopais
anteriores, usuários de anticoagulantes e gestantes.
Os pacientes
pré-selecionados foram submetidos à
avaliação da probabilidade pré-teste através da pontuação no escore de Wells
simplificado e mais à dosagem do D-dímero.
A positividade de um desses dois itens, ou de ambos,
levaria o paciente à realização de exame de imagem: Angio-Tc de tórax ou
Cintilografia pulmonar de ventilação-perfusão (como alternativa aos portadores de
contraindicações à angio-TC). A negatividade do D-dímero somada à baixa
probabilidade pré-teste pelo escore de Wells simplificada, afastariam a possibilidade
de TEP e nenhum teste adicional seria necessário.
Entre 2012 e
2014, mais de 2500 pacientes foram admitidos com síncope nas emergências dos 11
hospitais participantes, mas somente 717 foram internados e consequentemente pré-selecionados.
Após a aplicação dos critérios de exclusão e termo de consentimento, 560 foram
finalmente incluídos no estudo . Este número foi compatível com o tamanho
amostral pré calculado de 550 pacientes, baseado numa prevalência estimada de
10-15% de TEP.
Entre os 560
pacientes incluídos no estudo, 330 (ou 59%) tiveram o diagnóstico de embolia
pulmonar afastado por possuírem a combinação de baixa probabilidade pré-teste e
D-dímero negativo. 230 pacientes,
portanto, apresentaram as condições necessárias para a realização de exames de
imagem.
A embolia
pulmonar foi confirmada em 97 pacientes, o que equivale a 42,2% dos pacientes com
triagem positiva e submetidos a exames de imagem (IC 95%: 35,8 - 48,6); e em
toda a amostra, a prevalência foi de 17,3% (IC 95%, 14,2 - 20,5).
Um em cada
seis pacientes é uma prevalência considerável. Mas aqui cabem inúmeras
considerações e reflexões. Vamos a elas: A grande maioria dos pacientes
admitidos no estudo eram muito idosos (cerca de 75% eram > 70 anos), o que
denota mais elevado grau de fragilidade e predisposição à maior gravidade
clínica. Além disso, maior prevalência
de TEP foi notificada naqueles pacientes sem uma outra causa provável para o
evento sincopal.
Quanto à
carga trombótica, a grande maioria dos portadores de TEP com síncope possuíam
envolvimento de vasos mais centrais, com elevado grau de comprometimento da
circulação pulmonar. Mais uma ressalva: um número razoável de pessoas
com quadro sincopal e TEP ( cerca de 40% dos pacientes ) apresentavam
envolvimento mais distal (segmentar e subsegmentar): há realmente nestes casos
relação de causa e consequência? Ou estamos atribuindo ao TEP uma síncope por
outra causa? É possível que ambas as possibilidades estejam certas.
Qual o
impacto dessas informações para a nossa realidade? De que modo isto irá
modificar e/ ou influenciar nossas condutas clínicas? Iremos solicitar mais
angiotomografias nos pacientes com síncope? Iremos anticoagular mais estes
pacientes? Devemos sim incluir o TEP entre os diagnósticos diferenciais para síncope em que causas neuromediadas ou situacionais foram afastadas. Mas em medicina não há “receita de bolo” a ser seguida. As decisões dignósticas e terapêuticas devem ser sempre analisadas de forma personalizada. A avaliação da probabilidade pré-teste, a triagem através do D-dímero, a história e o cenário clínico devem ser considerados caso a caso, antes de medidas mais específicas .
Anticoagular
um paciente custa um preço, muitas vezes bastante elevado. Anticoagular um paciente com 75 anos, com múltiplas
comorbidades, após receber elevada carga de contraste iodado e descobrir um TEP
subsegmentar que pode não ser a causa da síncope pode custar ainda mais.
É preciso
calma para não atropelar o passo a passo da boa prática clínica. No afã de
diagnósticos elaborados e rápidos, podemos perder a oportunidade de
individualizar o cuidado ao nosso paciente, evitando assim o “overdiagnosis” e
tratamentos desnecessários.
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