BENEFIT – Há esperança
no tratamento da Doença de Chagas Crônica?
“Randomized
Trial of Benznidazole for Chronic Chagas’ Cardiomyopathy”, este foi o título de
um dos estudos mais esperados entre os cardiologistas brasileiros e que deveria
revolucionar o tratamento e a evolução da doença de Chagas na sua forma
crônica.
Publicado em
outubro de 2015 na revista New England Journal of Medicine, o estudo envolveu
49 centros clínicos distribuídos em 5 países ( Brasil, Argentina , Colômbia,
Bolívia e El Salvador) , de onde foram
recrutados e randomizados 2854 pacientes, portadores de Doença de Chagas na sua
forma crônica , para receber Benznidazol ou placebo, por um período variável entre
40 e 80 dias, com seguimento médio durante 5-6 anos. O racional do estudo, baseado nas evidências
atuais da permanência parasitária, mesmo na forma crônica da doença, era que,
os doentes tratados com Benznidazol , tivessem redução nos desfechos clínicos
combinados, caracterizado como primeiro episódio de Morte, parada cardíaca
ressuscitada, inserção de marcapasso ou CDI, taquicardia ventricular sustentada,
transplante cardíaco, novos sintomas de insuficiência cardíaca, acidente
vascular cerebral ou ataque isquêmico transitório e evento tromboembólico
sistêmico ou pulmonar. Como resultado, o BENEFIT (Benznidazole Evaluation for Interrupting Trypanosomiasis)
não mostrou diferença estatisticamente significante entre os grupos, para
redução de eventos elencados no desfecho primário.
No desfecho secundário, foi avaliada a
negativação da parasitemia entre os grupos, levando em consideração a análise
de PCR para o DNA do Trypanosoma cruzi. Dos 2854 pacientes participantes do
estudo, apenas 1487 tiveram amostras coletadas para análise de PCR ao final do
estudo. No grupo droga, 59,5% dos pacientes tiveram PCR positivo no ínicio do
estudo, para 61,7% no grupo controle. Ao final do estudo, houve negativação do
PCR em 46,7% dos pacientes que utilizaram benznidazol e estranhamente também houve
negativação de 33% no grupo controle, com diferença estatisticamente significante
entre os grupos (p<0,001 para todas as comparações). A análise do desfecho
secundário nos leva a refletir sobre a natureza aleatória deste resultado,
relacionado mais com o caráter cíclico da parasitemia do que com a real
negativação desta.
Os autores
concluíram que, entre os pacientes com cardiomiopatia chagásica estabelecida, o
tratamento com benznidazol reduziu significativamente a detecção de parasitas
circulantes, mas não reduziu a progressão clínica cardíaca. Mas será que o estudo
foi dimensionado para propor causalidade entre redução da parasitemia e redução
de eventos compostos do desfecho primário? Ao que
parece, O BENEFIT foi concebido, em seu protocolo original, para ser um estudo
pragmático, onde seria possível avaliar a eficácia e segurança do Benznidazol
em comparação com placebo, na redução de desfechos clínicos, entre pacientes
com cardiomiopatia chagásica crônica. Sua amostragem e metodologia utilizada,
foram calculadas para conferir um poder de 90% na detecção de 26% na redução de
risco relativo entre os grupos para os eventos do desfecho primário, o que não
se extrapola para determinar causalidade.
Sendo assim, o
que ocorreu então, foi uma tentativa frustrada em demostrar causalidade entre a
negativação da parasitemia e o desfecho clínico, com o resultado da análise de
um desfecho secundário ocupando um papel tão central na conclusão do trabalho,
de forma não adequada.
Comentários
Postar um comentário