A Kind of Magic! O estudo SECURE-PCI
O estudo SECURE-PCI foi um ensaio
clínico publicado no JAMA em 11 de março de 2018. Foi um estudo brasileiro,
coordenado pelo Research Institute Heart Hospital e Brazilian Clinical Research
Institute.
Trata-se de um ensaio clínico
randomizado, placebo-controlado, multicêntrico (53 centros brasileiros), duplo
cego, cujo objetivo principal foi avaliar o efeito de doses de ataque de
atorvastatina em Evento Cardiovascular Adverso Maior (MACE), composto por:
mortalidade por todas as causas, IAM, AVC e revascularização coronária
não-planejada ao longo de 30 dias, em pacientes com síndrome coronariana aguda
(SCA) e manejo invasivo planejado para até 07 dias do evento. Os desfechos
secundários eram a ocorrência dos mesmos MACE's em 6 meses e 1 ano.
Para isso, os pacientes admitidos
nos departamentos de emergência com SCA e intervenção coronariana percuntânea
(ICP) planejada foram randomizados para receber 80 mg de Atorvastatina (n=2087)
ou Placebo (n=2104), antes e depois do procedimento e em seguida, todos
receberam Atorvastatina 40mg por 30 dias e foram reavaliados ao final desse
período quanto à presença ou não de MACE. Novas avaliações foram feitas em 06
meses e 01 ano.
Feito isso, os pesquisadores
constataram uma menor incidência de MACE no grupo da atorvastatina (6,2% x
7,1%), porém sem significância estatística, P = 0,27, concluindo, corretamente,
que dose de ataque de atorvastatina “peri-ICP” NÃO reduz a taxa de Evento
Cardiovascular Adverso Maior em 30 dias.
É um estudo de elevada qualidade
metodológica. Notável por exemplo, o poder da amostra, estimado e alcançado de
90% para detectar reduções de risco de até 25%; também a análise principal do
tratamento baseada no princípio da intenção de tratar, que torna o resultado
mais fidedigno à vida real, em que temos cross-over entre pacientes com
programação inicial para receberem ou não tratamentos.
Entretanto, não é um estudo de
elevada qualidade científica, afinal, não há plausibilidade biológica em
esperar que duas doses a mais de estatina (antes e após a ICP), ante 30 dias de
tratamento, tenha influência capaz de reduzir desfechos clínicos.
Portanto, concluiu algo que já
imaginávamos ser a verdade antes da realização do trabalho e por isso, em
termos de produção de conhecimento científico, agrega pouco, a não ser para
aqueles que acreditavam no poder dessas doses de ataque de estatina como um
tipo de magia, já que esse pensamento não se sustenta em plausibilidade
biológica.
Merece elogio em ter reconhecido
e publicado o resultado negativo, ao invés de se submeter à diversas violações
do método científico para publicar um desfecho positivo, muitas vezes
questionável, porém, de maior notoriedade na comunidade científica e maior
publicidade e interesse da indústria farmacêutica, porém, desnecessariamente, valoriza
demais o resultado positivo encontrado na análise de subgrupo de pacientes com
IAM-CSST durante sua discussão: numa mesma coluna de texto ele “lembra” três
vezes desse achado, que pode sugerir um benefício nesse subgrupo de pacientes.
Devemos lembrar que análises de
subgrupos são resultados exploratórios, que devem ser confirmados em outros
estudos desenhados para tal fim. Estão muito sujeitos ao acaso, pois, como o
estudo não foi projetado para identificar tais achados, o método científico que
visa também eliminar vieses, não foi aplicado a ele.
Em suma, este estudo confirma o que já
imaginávamos: não há indicação para usarmos doses de ataque de estatina
peri-ICP em pacientes com SCA no intuito de prevenir desfechos clínicos, a não
ser que acreditemos em mágica.João Kleber Menezes
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