SEMPRE TEMOS QUE DEMOSTRAR SUPERIORIDADE?






http://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa1514616

Quando estamos de frente a um artigo científico, pensamos quase de imediato, será que essa nova terapêutica é melhor do que a padrão?

Será que essa busca eterna pelo resultado superior é o mais importante em um estudo?

O PARTNER 2 é um exemplo de estudo que não seguiu essa linha clássica de superioridade na comparação entre grupo do TARV (Transcatheter aortic-valve replacement) e a troca valvar cirúrgica. O estudo foi realizado para avaliar a não inferioridade do grupo TARV frente à troca valvar cirúrgica.

Um estudo de não inferioridade, tem com finalidade demostrar uma certa igualdade ou até que demostre uma inferioridade até um limite, este limite seria um intervalo de confiança (IC) pré-estabelecido, por convenção um IC de até 1,5; no PARTNER  2 foi estimado um IC de ATÉ 1,20.

Como um estudo pode demonstrar relevância tendo IC maior do que 1?

Em estudo de não inferioridade, considera-se o IC ultrapassando o valor 1, pois a hipótese alternativa é de que os tratamentos comparados tenham um grau de semelhanças, podendo a terapia testada até ser um pouco inferior em relação a terapia padrão contanto que agregue outros benefícios, como maior facilidade na execução, menos morbidade.

Um exemplo interessante desse fato é a intervenção coronária que é inferior a revascularização cirúrgica em reestabelecer o fluxo coronário. Porém, como a intervenção coronária é um procedimento de fácil execução e possui menos complicações, optamos por utilizá-lo sempre que possível em vez do tratamento cirúrgico.

O PARTNER 2 foi um estudo que trouxe a comparação de TARV com o tratamento cirúrgico em pacientes de risco cirúrgico intermediário. Neste estudo randomizado, prospectivo, aberto, teve como desfecho primário morte por qualquer causa e incapacidade por acidente vascular cerebral isquêmico (AVCI).
Um desfecho primário combinado parece uma tentativa de demostrar o efeito líquido da intervenção. Idealmente o desfecho primário deveria ser morte por qualquer causa, demostrando o efeito do TARV e o AVCI como é uma complicação do procedimento, seria mais interessante sua análise como desfecho secundário.
Por se tratar de um estudo aberto já nos traz a ideia do viés de desempenho, que poderia ser descartado pela simples demonstração da distribuição da forma do tratamento ao longo do tempo nos grupos. Infelizmente estes dados não foram demostrados no presente estudo.

No PARTNER 2, utilizou a intenção de tratar (que envolve todos os pacientes do processo, trados ou não) e “as-treated” (somente pacientes que foram tratados). Quando se realiza um estudo de não inferioridade o método de intenção de tratar, por manter pacientes que não chegaram a realizar o tratamento, beneficiando a análise de não inferioridade. Desta forma um estudo de as-treated, ou por protocolo, seriam os mais adequados

Nos dados do PARTNER 2 trazem um IC dentro do esperado, chamando atenção nos gráficos e nas tabelas) o valor de p demostrado como uma análise bicaudal característico de um estudo de superioridade.

Por exemplo, no gráfico:


O valor de P:0,25 quis provavelmente demostrar que não há diferença entre as intervenções, numa ideia de superioridade, porém, seu valor deveria ser de 0,0001 que demostra não inferioridade.

Será que o autor não se sentiu a vontade em demostrar que seu estudo teve o resultado desejado de não inferioridade? Desta forma ele utilizou o P de um estudo de superioridade?

Ou a ideia de superioridade está tão enraizada no pensamento de nós médicos “consumidores de artigos científicos” que o autor julgou que seria mais atraente demonstrar um P que teoricamente traduza a não diferença entre o tratamento, ao invés de um p que demonstraria a não inferioridade.

Isso é demostrado na conclusão onde é colocado que os tratamentos são similares entre TARV e cirurgia, onde deveria citar que o TARV não é inferior ao tratamento cirúrgico.

De qualquer forma, o objetivo do estudo foi alcançado.

O PARTNER 2, apesar de ser um estudo totalmente financiado e acompanhado de perto pelos patrocinadores, fabricantes das válvulas, ele apresentou um resultado satisfatório na tentativa de demostrar não inferioridade da TARV com troca valvar cirúrgica em paciente cirúrgico intermediário. Vale ressaltar que para sua utilização são necessários profissionais com experiência neste tipo de abordagem.






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