Série NOACs: ARISTOTLE Trial e a evolução dos anticoagulantes orais
Em 2011 o estudo ARISTOTLE entra em cena para selar o
destino dos NOACS na fibrilação atrial.
Após a Dabigatrana (que no RE-LY trial mostrou-se não
inferior ao Warfarin na dose de 110mg 2 vezes ao dia com redução de
sangramentos maiores e morte em relação àquele; e superior ao Warfarin na dose
de 150mg 2 vezes ao dia ) e a
Rivaroxabana (que no ROCKET AF
mostrou-se não- inferior ao Warfarin em dose única diária, a despeito de sua
meia-vida de 12 horas, mas também com a vantagem da redução de sangramentos
maiores) a Apixabana é apresentada ao mundo com a pretensão de ser a "melhor de
3".
O ARISTOTLE, de forma audaciosa, propôs-se a provar ser a
Apixabana superior à Warfarina em anticoagulação na FA, com menor ocorrência de sangramentos e redução na mortalidade por qualquer causa.
Mas, embora pretensioso, o estudo foi cuidadoso o suficiente
para, antes de tudo, atestar a sua não inferioridade em relação ao Warfarin na
redução da taxa de AVE (isquêmico ou hemorrágico) e embolia sistêmica, sendo
este o seu objetivo primário de eficácia. Ao mesmo tempo, o objetivo primário
de segurança foi avaliar a ocorrência de
sangramentos graves (definidos pela Sociedade Internacional de trombose e
hemostasia – ISTH). Realizou testes sequenciais hierárquicos pré-especificados
no desfecho primário de não
inferioridade, depois de superioridade, em seguida para sangramentos maiores e,
por fim, para avaliar morte por qualquer causa, como medida para evitar a
ocorrência de erro tipo I.
O ensaio clínico, aplicado em 39 países e mais de mil
centros, obteve um N exuberante de 18.200 pacientes. Randomizado 1:1, duplo cego e duplo
simulado (“doube-dummy”), o estudo foi desenhado para permitir até 40% dos
pacientes usuários prévios de Warfarin. O desfecho primário de eficácia seria AVE
ou embolia sistêmica. O desfecho secundário da eficácia : IAM e morte por
qualquer causa. O Desfecho primário de segurança : sangramento grave (critérios
da ISTH). E desfecho secundário de segurança: o composto de sangramento maior
e sangramento não-maior importante clinicamente (que não satisfazem os critérios
do ISTH).
Foram incluídos pacientes com FA ou
Flutter atrial à admissão ou pelo menos 2 episódios documentados nos últimos 12
meses antes da randomização. Excluiu portadores de causas reversíveis, portadores de próteses valvares metálicas ou outra
condição em que fosse imperativo o uso de Warfarin, AVE recente, estenose
mitral grave, uso de DAPT e insuficiência renal grave ( com ClCr < 25
ml/min). Todos os pacientes deveriam ter pelo menos CHADS² = 1 (a maioria era ≥2).
A dose padrão utilizada foi de 5mg 2x ao
dia de Apixabana; entretanto, caso o indivíduo apresentasse 2 ou mais dos
seguintes critérios: idade acima de 80 anos, Creatinina ≥ 1,5 ou peso abaixo de
60 kg, usaria metade da dose padrão. O Warfarin, por sua vez, seria
introduzido na dose de 2mg/ dia com ajuste de dose para manter RNI = 2-3.
O Estudo, que metodologicamente foi bem
executado e não reproduziu os erros dos seus antecessores, chegou ao fim de
quase 2 anos de seguimento com seus objetivos cumpridos: demonstrou não somente
não inferioridade, mas mostrou-se superior ao Warfarin, reduzindo em cerca de
20% a ocorrência do desfecho primário de AVE ou embolia sistêmica (HR = 0,79;
IC 95% 0,66-0,95; p=0.01). E,
finalmente, com relação ao desfecho primário de segurança, houve redução da
ocorrência de sangramentos maiores em cerca de 30% com o uso da Apixabana em
relação ao Warfarin (HR = 0,69; IC 95% 0,60-0,80; p< 0,001).
Algumas ressalvas devem ser feitas: a primeira é de que na análise de subgrupos para o desfecho primário,
os resultados não foram tão expressivos em pacientes com menos de 65 anos e
naqueles com uso de dose reduzida (2,5mg 2 x dia). A segunda é que com relação
aos sangramentos maiores, também na análise de subgrupos, observou-se resultados
não tão animadores quando os pacientes eram diabéticos. A terceira ressalva é a
de que o estudo sugere redução de morte por qualquer causa em cerca de 11% (HR
= 0,89) entretanto, observamos um IC 95% = 0,8 – 0,998 com p valor batendo na
trave (p= 0,047).
As reflexões que surgem ao fim da nossa "trilogia" são: Atingimos a evolução da anticoagulação?
Ou algo mais está por vir? Devemos considerar agora o Warfarin como droga relegada
à segunda escolha neste cenário?... Certamente seria, se não fossem os elevados
custos da terapia com os NOACs, tendo em vista a realidade social da população
a que assistimos. Isto deve sim ser levado em conta na hora de prescrevermos
anticoagulação a um portador de FA, uma vez que, sem recurso para os gastos em
saúde, a adesão terapêutica estará comprometida. Neste caso, Warfarin é e sempre será "melhor
que nada". Aguardemos, portanto a quebra das patentes para que esta "Evolução" possa chegar a quem precisa de forma mais democrática e segura.
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